terça-feira, 9 de junho de 2009

A vida tem dessas coisas....

Algo aconteceu e a tristeza bateu em mim: o acidente aéreo que fez partir 228 pessoas. 228 sonhadores, 228 destinos...
Relutei bastante em trazer esse assunto ao blog. Mas tristeza também faz parte da vida.
Vejo que essa trágica notícia, ainda está deixando pessoas tristes... Vejo isso na tv, no jornal,na internet... Tá certo, tem o lado sensacionalista da imprensa, mas tem o lado humano também... Eles merecem toda essa comoção...
No último dia 03, Martha Medeiros teve sua crônica sobre o assunto, publicada no Jornal Zero Hora. No seu blog, ela disse estar orgulhosa do que havia escrito e que queria que essa crônica fosse divulgada país afora. Eis-me aqui, divulgando-a:


O AVIÃO

Desde 1906, quando Santos Dumont pilotou o primeiro avião, o 14-Bis, fazendo-o levantar voo com total autonomia, sem a ajuda de uma catapulta (como fizeram três anos antes os irmãos Wright), o mundo se curvou diante dessa invenção. O avião tem mais de 100 anos e segue mantendo uma aura de mistério e classe. Voar sempre foi o maior desejo do homem, e mesmo que hoje cruzem pelo céu milhares de aeronaves que partem e chegam dos mais diversos pontos, ainda assim é um meio de transporte que não se trivializou, e creio que manterá para sempre sua imponência.
Diariamente, vidas se perdem em acidentes de ônibus, de carro, de moto, de barco, e tudo é sempre muito comovedor, pois é o destino interrompendo a trajetória de alguém. Uma vez escutei que a morte de uma única pessoa é sempre uma tragédia, enquanto que a morte de centenas é apenas uma estatística. Uma visão fatalista da realidade, mas que não se aplica aos acidentes aéreos. Recentemente, uma família inteira faleceu durante a explosão de uma aeronave que aterrissava em Trancoso, na Bahia, e ficamos compungidos. Agora são 228 homens e mulheres desaparecidos, e ficamos muito mais. Nenhum desses corpos faz parte de uma estatística, e sim de um mito: a morte coletiva no veículo que é considerado o mais seguro do mundo e, ao mesmo tempo, a morte individual do sonho de cada um dos passageiros e tripulantes. Porque um avião está sempre carregado de sonhos.
A garota que finalmente conseguiu uma bolsa para estudar na Europa. O casal que contava os minutos para sua lua-de-mel. O grupo de amigos que economizou anos para fazer uma longa viagem depois da formatura. O empresário que se preparou para fechar um acordo internacional. O artista que iria lançar seu trabalho em solo estrangeiro. O jogador de futebol se transferindo de time. A mãe que visitaria a filha pela primeira vez do outro lado do oceano. Um avião transporta todas essas histórias que, para a grande maioria da população, são contos-de-fada. Mesmo nos voos domésticos, muitos deles precedidos de atrasos e bagunças em aeroportos, a fleuma se mantém. Ninguém esquece a primeira vez em que apertou o cinto e prestou a maior atenção nas informações que a comissária transmitia, com seus braços parecendo asas sinalizando as saídas de emergência. Nervosismo e êxtase: o risco levado a sério.
Então aquele bicho enorme e pesado ganha velocidade e começa a subir. A cidade vai ficando minúscula lá embaixo, as nuvens vão passando ao lado da sua janela, e o dia nublado e chuvoso deixado pra trás transforma-se num céu límpido, descortinado. Poucas horas depois, Rio de Janeiro, Salvador. Outras horas adiante, Londres, Nova York. Isso nunca vai ser considerado banal, por mais milhas que um viajante acumule.
Todas as pessoas têm sonhos, não importa de que tamanho. Todas merecem ser pranteadas, não importa de que modo falecem. Mas há coisas na vida que pertencem a um deslumbramento que não obedece à lógica. Um avião que cumpre a sua trajetória do início ao fim está realizando um passe de mágica com o qual ainda não nos acostumamos, prova disso é o número de gente que, em terra firme, assiste decolagens e aterrisagens como se fosse um espetáculo - e é. Quando a mágica não funciona, voltamos todos a um estado de descrença e dor: a ilusão não se cumpriu.

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